O Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas celebra a data de 10 de Junho de 1580, data da morte de Camões e dia dedicado ao Anjo Custódio de Portugal. Este é também o dia da Lingua Portuguesa, dos cidadãos e das Forças Armadas.
Origens:
A pedido do rei D. Manuel, o Papa instituiu em 1504 a festa do «Anjo Custódio do Reino» cujo culto já seria antigo em Portugal.
Santo Anjo da Guarda de Portugal, Anjo Custódio de Portugal e Anjo da Paz) é uma das designações atribuídas a São Miguel Arcanjo que representa "Portugal", ou seja, a essência espiritual na figura de um arcanjo que protege a nação portuguesa.
Terá surgido pela primeira vez na batalha de Ourique e a sua devoção deu uma tal vitória às forças de D. Afonso Henriques sobre os invasores muçulmanos que lhe deu a oportunidade de autoproclamar-se rei de Portugal.
A primeira referência ao caráter festivo do dia 10 de junho é no ano 1880 por um decreto real de D. Luís I que declara "Dia de Festa Nacional e de Grande Gala" para comemorar apenas nesse ano os 300 anos da hipotética data da morte de Luís de Camões, 10 de junho de 158O.
Assim, e por iniciativa de afamados republicanos, a 10 de Junho de 1880 comemorou-se o tricentenário da morte de Camões, em grande parte muito devido a Teófilo Braga. A Comissão executiva do centenário, eleita pelos jornalistas e organizada por Latino Coelho, era composta por nove membros, todos eles homens de esquerda e republicanos, com excepção de Pinheiro Chagas. Foi através de Teófilo que a comissão conseguiu que um deputado do governo, Simões Dias, apresentasse ao parlamento um projecto para que o dia 10 de Junho fosse considerado de festa nacional. Ramalho Ortigão redigiu o programa de um cortejo simbólico, que representava o povo e as suas sucessivas conquistas de liberdade.
Lisboa
Festas Camonianas, 1880
O Camões das comemorações, mantendo a mitologia romântica, aparece com uma carga ideológica muito forte, que faz emergir o lado épico da história pátria para melhor acentuar o contraste com a decadência do então presente monárquico.
Com o Estado Novo e até ao 25 de Abril de 1974, o 10 de Junho era conhecido como o Dia de Camões, de Portugal e da Raça, este último epíteto criado por Salazar na inauguração do EstádioNacional do Jamor em 1944.
A obra, à imagem e semelhança do grandioso estádio de Berlim de Hitler, ganhou contornos propagandísticos e durante os anos da ditadura recebeu sempre as cerimónias do Dia de Portugal.
A partir de 1963, o 10 de Junho tornou-se numa homenagem às Forças Armadas Portuguesas, numa exaltação da guerra e do poder colonial.
Com uma filosofia diferente, a Terceira República converteu-o no Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas em 1978.
E hoje? Amanhã? Qual será o caminho?
O discurso proferido em 2019 por João Miguel Tavares nas cerimónias solenes deste dia, e com o qual acabamos, talvez nos aponte o caminho correto. É só ter coragem de o seguir...
“ Partilhamos uma língua, um país com uma estabilidade de séculos, sem divisões, e é uma pena que por vezes pareçamos cansados de nós próprios. Tivemos História a mais; agora temos História a menos. Passámos da exaltação heróica e primária do nosso passado, no tempo do Estado Novo, para acabarmos com receio de usar a palavra “Descobrimentos”. Simplificamos a História de forma infantil.
No século XVI, Luís de Camões já cantava os seus amores por uma escrava de pele negra – tão bela e tão negra que até a neve desejava mudar de cor. Para desarrumar os estereótipos, talvez precisemos de um pouco menos de Lusíadas e de um pouco mais de lírica camoniana.
Menos exaltação patriótica e mais paixão por cada ser humano – eis uma fórmula que me parece adequada aos tempos que vivemos. Sendo já poucos os que acreditam nas grandes narrativas, continuamos a acreditar nas pessoas que temos ao nosso lado.
E esse é o caminho para a identificação possível dos portugueses com Portugal.”
Endechas a Bárbara escrava
Aquela cativa
Que me tem cativo,
Porque nela vivo
Já não quer que viva.
Eu nunca vi rosa
Em suaves molhos,
Que pera meus olhos
Fosse mais fermosa.
Nem no campo flores,
Nem no céu estrelas
Me parecem belas
Como os meus amores.
Rosto singular,
Olhos sossegados,
Pretos e cansados,
Mas não de matar.
U~a graça viva,
Que neles lhe mora,
Pera ser senhora
De quem é cativa.
Pretos os cabelos,
Onde o povo vão
Perde opinião
Que os louros são belos.
Pretidão de Amor,
Tão doce a figura,
Que a neve lhe jura
Que trocara a cor.
Leda mansidão,
Que o siso acompanha;
Bem parece estranha,
Mas bárbara não.
Presença serena
Que a tormenta amansa;
Nela, enfim, descansa
Toda a minha pena.
Esta é a cativa
Que me tem cativo;
E. pois nela vivo,
É força que viva.
Luís Vaz de Camões
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